PROJETO INFÂNCIAS


Imagine ter um rio como quintal ou morar no meio do sertão?

Já imaginou deixar o seu filho engolir um peixinho vivo ou brincar com um facão?

Não? Mas, esta é a realidade de muitas crianças espalhadas por este Brasilzão! E não precisamos ir  muito longe, é logo ali, basta mudar de bairro, basta mudar de cidade, basta mudar a realidade em que este pequeno cidadão esta inserido.
O Projeto Infâncias nos aproxima destas diferentes realidades, registrando os diversos “quintais” espalhados pelo nosso país. 


Conversei com Gabriela Romeu, uma das idealizadoras do Projeto Infâncias.




T- Como surgiu o Projeto Infâncias? Quem faz parte?
G- O Infâncias é um projeto que vem sendo gestado em mim há algum tempo. No jornal Folha de S.Paulo, onde sempre trabalhei na área da infância, fiz muitas reportagens que falavam da vida das crianças. Eram reportagens em que buscava dar voz às crianças e mostrar a diversidade das infâncias. Esse era o trabalho que mais fazia meu olho brilhar no jornal: conhecer o Brasil e a infância brasileira. E o Infâncias vem um pouco daí. Há alguns anos, conheci amigos ligados à cultura da infância (Renata Meirelles e David Reeks) e que me inspiraram e motivaram a seguir com força nessa estrada. Atendi a um chamado bastante forte. Chamei a jornalista Marlene Peret, que é especializada em empreendedorismo social e já viajou muito pelo país, a embarcar nessa viagem. Juntas, idealizamos o Infâncias, que tem a parceria de Samuel Macedo, um fotógrafo com olho de menino, que é nosso grande parceiro de viagem. O projeto nasceu num 2 de fevereiro de 2012, dia de Iemanjá, que nos abre os caminhos pelas estradas das infâncias do país e fora dele.

T- Com ele é viabilizado?
G- Há um investimento nosso nas viagens – é difícil o financiamento de pesquisa no Brasil, infelizmente. Os resultados do projeto são feitos por editais, leis de incentivo e outras parcerias. No percurso de dois anos, montamos um exposição itinerante chamada Infâncias, publicamos uma série de reportagens no jornal Folha de S.Paulo, estamos finalizando o curta-metragem Meninos e Reis, sobre a infância e o reisado no Cariri cearense com recurso de um edital, e vamos lançar dois livros.






T- Como vocês mapearam a infância no Brasil?
G- Poxa, acho que uma vida inteira não bastaria para conseguir mapear as infâncias brasileiras. Nesses últimos meses, visitamos quintais do Brasil, conhecemos diferentes realidades infantis, tentamos entrar no universo das crianças e convidá-las a nos contar um pouco sobre seu universo e mostrar seus saberes e fazeres. As crianças nos receberam com uma generosidade do tamanho de sua sabedoria…
T- Como chegam a estes diferentes quintais? Como é feita esta aproximação?

G- Um pouco pelo nosso desejo de conhecer lugares e infâncias, um pouco pelos contatos que temos pelo Brasil afora. Visitamos comunidades extremamente acolhedoras e generosas e só temos muito que agradecer a todas elas. No caminho, encontramos pessoas que são nossos “guias” e nos ajudam muito a achar a melhor trilha para as infâncias brasileiras.


T- Vocês sempre levam uma mala com objetos da infância dos lugares visitados. Esta mala é compartilhada com as crianças? Existe uma troca entre vocês e as crianças na maneira de brincar?

G- O percurso de um projeto é muito dinâmico. Começamos com uma mala, levando objetos e outros apetrechos, mas no caminho ela ficou pesada demais. Não temos carregado essa mala – mas sua pergunta me fez pensar se não é o caso de voltar com essa ideia… O que temos feito bastante é um intercâmbio de histórias – as crianças nos contam muitas – e isso é sempre interessante e riquíssimo.




T- Lugares, realidades, brincadeiras. Como é a relação dos pais com seus filhos na arte de brincar?
G- O que mais percebo é que os adultos pouco sabem sobre as crianças. É comum chegar a um lugar e perguntar aos pais e professores o que as crianças fazem ali – e essa pergunta não remete somente ao brincar, já que o Infâncias tem uma busca em registrar o cotidiano e o imaginário infantil. Geralmente, eles não fazem ideia da sabedoria das crianças e do seu rico cotidiano. Lembro-me de um filme que passou recentemente numa mostra incrível em São Paulo – Ciranda de Filmes. É o clássico “O Pequeno Fugitivo”, que traz uma infância dos anos 50 pelas ruas de Nova York (sim, as crianças tomavam os quarteirões!) e conta as aventuras do pequeno Joe – aventuras essas que a mãe nem faz ideia. Mas, claro, há muitos adultos sensíveis ao universo das crianças e que estão sempre por tempo, não tutelando, mas permitindo que as crianças possam ser… crianças!


T- A importância do brincar é reconhecida em todas as regiões?
G- Não, e isso nem nos grandes centros urbanos nem no interior do país. A diferença é que há lugares em que as crianças têm mais oportunidades para viver a infância como uma experiência plena, rica. E pode acontecer num quintal da cidade ou num quintal-rio do interior do país. Vejo muitos paradoxos. Por exemplo, estamos voltando de uma viagem da região pantaneira, um lugar de beleza de tirar fôlego. Passamos por uma escola que fica às margens do rio Paraguai, que traz uma brisa incrível. Um ribeirinho nos disse: “Ser pantaneiro e ter o vento norte no peito". "Está sentindo?”, seguiu perguntando enquanto tomava seu tererê. Sim, estava sentindo. Enquanto isso, as crianças pantaneiras tinham aula numa sala abafada, com janela diminuta… Se a escola não se conecta com o lugar onde está inserida, como vai se conectar com a infância e sua linguagem mais genuína (o brincar)?







T- Conhecer o brincar das mais diferentes formas, nas mais destintas realidades faz com que o Projeto Infâncias tenha um material único. De que forma este material é divulgado, como chega ao grande público?
G- O Infâncias não é um projeto sobre o brincar, sabe? Como coordenei o projeto Mapa do Brincar (www.mapadobrincar.com.br) e fiz a curadoria da exposição Trilhas do Brincar com a Renata Meirelles, fiquei muito voltada ao tema nos últimos anos, desde 2009. Nos últimos dois anos, produzimos vários pequenos documentários para a exposição Trilhas do Brincar também. Vamos caminhando-viajando e ajustando nosso foco. Nosso desejo é mostrar os cotidianos e os imaginários infantis, trazer histórias de meninas e meninos pescadores, boiadeiros, caçadores, remadores e muitos outros – assim como temos trazido na série Quintais, publicada na Folhinha - http://www1.folha.uol.com.br/folhinha/2014/04/1439281-criancas-cacam-e-domam-jumentos-no-sertao-do-ceara.shtml. Mostrar a criança como protagonista em seu cotidiano, em seu quintal. Bem, sobre chegar ao público, estamos batalhando bastante para conseguirmos recursos para finalizar e distribuir esse material – tanto nas comunidades envolvidas como em outras escolas e cidades.






T- Futuros projetos?
G- Estamos agora trabalhando na finalização de materiais - um filme e dois livros. Também estamos empenhados em fazer uma série de documentários com nossos registros audiovisuais. E seguimos viajando, agora alcançando as fronteiras do país. Te respondo esse e–mail de Corumbá (MS), onde visitamos a fronteira com a Bolívia. Queremos muito visitar os quintais de outros países…






Gabriela Romeu é uma jornalista especializada em produção cultural para a infância. Há 14 anos escreve sobre e para crianças no jornal Folha de S.Paulo, onde editou o caderno Folhinha e produziu diversas reportagens sobre as realidades infantis do Brasil. Atualmente escreve crítica sobre teatro infantil para o Guia da Folha, indica produções culturais (livros, peças teatrais, exposições etc.) para crianças na coluna Eleitos da revista Sãopaulo e publica mensalmente no caderno Folhinha a série de reportagens Quintais, que trata sobre o cotidiano, o imaginário e o brincar das crianças em diferentes cantos do país. Foi uma das idealizadoras e coordenadora do projeto Mapa do Brincar (www.mapadobrincar.com.br), vencedor do Grande Prêmio Ayrton Senna de Jornalismo e do Prix Jeunesse Iberoamericano. Crítica de teatro infantil, é membro da APCA (Associação Paulista de Críticos de Arte) e jurada do Prêmio Femsa de Teatro Infantil e Juvenil. Em parceria com a antropóloga Elizabeth Rodrigues da Costa, é coautora do livro Tutu-Moringa – História que Tataravó Contou (Companhia das Letrinhas), que recebeu o selo Altamente Recomendável da FNLIJ. É cocuradora da exposição Trilhas do Brincar (Sesc Santos, Sesc Santo André e Sesc Araraquara), que reuniu a pesquisa do Mapa do Brincar e depois do Infâncias, entre outros projetos. É uma das idealizadoras do projeto Infâncias (www.projetoinfancias.com.br), que está documentando a vida das crianças em diferentes lugares do país. 

 (fotos: Samuel Macedo e Gabriela Romeu)


www.projetoinfancias.com.br

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